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quinta-feira, 8 de abril de 2010



A urgência de viver

Henry Sobel*


“Todos os anos, nesta hora de Neilá, eu observo os seus rostos e vejo algo indefinível em suas expressões. Sei lá, um misto de alegria e tristeza… não sei se “tristeza” é a palavra certa, talvez ‘apreensão’. Antigamente, eu não entendia o porquê. Hoje, um pouco mais velho, um pouco mais maduro, um pouco mais vivido, um pouco mais sensível, acho que consigo compreender.

A matemática da vida não é simples. Cada soma é também uma subtração. Quando somamos mais um Yom Kipur àqueles que já vivemos, subtraímos um Yom Kipur daqueles que nos restam para viver. Então, a felicidade de estarmos aqui hoje à noite vem acompanhada da melancólica percepção de que o tempo voa e a vida passa. Nesta hora de Neilá, talvez mais do que em qualquer outra, sentimos a urgência de viver. Teddy Kollek, o dinâmico prefeito de Jerusalém, propõe em sua autobiografia um décimo primeiro mandamento: ‘Não serás paciente’. À primeira vista, tal conselho parece ir contra uma das qualidades mais valorizadas pela humanidade - a paciência é uma virtude! No entando, ao refletirmos sobre as palavras de Kollek, percebemos que elas contêm uma grande sabedoria. A impaciência é necessária para remediar nossa tendência tão humana de protelar. Pois a verdade é que, em muitas áreas vitais da nossa existência, somos pacientes demais. Esperamos demais para fazer o que precisa ser feito, num mundo que só nos dá um dia de cada vez, sem nenhuma garantia do amanhã. Enquanto lamentamos que a vida é curta, agimos com se tivéssemos à nossa disposição um estoque inesgotável de tempo. Esperamos demais para dizer as palavras de perdão que devem ser ditas, para pôr de lado os rancores que devem ser expulsos, para expressar gratidão, para dar ânimo, para oferecer consolo. Esperamos demais para ser generosos, deixando que a demora diminua a alegria de dar espontaneamente. Esepramos demasi para ser pais dos nossos filhos pequenos, esquecendo quão depressa a vida os faz crescer e ir embora. Esperamos demais para dar carinho aos nossos pais, irmãos e amigos. Quem sabe quão logo será tarde demais? Esperamos demais para ler os livros, ouvir as músicas, ver os quadros que estão esperando para alargar nossa mente, enriquecer nosso espírito e expandir nossa alma. Esperamos demais para enunciar as preces que estão esperando para atravessar nossos lábios, para executar as tarefas que estão esperando para serem cumpridas, para demonstrar o amor que talvez não seja mais necessário amanhã. Esperamos demais nos bastidores, quando a vida tem um papel para desempenharmos no palco. Deus também está esperando – esperando nós pararmos de esperar. Esperando nós começarmos a fazer agora tudo aquilo para o qual este dia e esta vida nos foram dados. Meus amigos: é hora de viver.”



* O rabino Henry Sober mora no Brasil (em São Paulo) há cerca de 30 anos. Ele pronuncioueste sermão, de sua autoria, no Yom Kipur, o dia do perdão, que antecede a entrada do Ano-Novo judaico. Neilá é a ultima oraçao do Yom Kipur.

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